Quando o marinheiro deixa de controlar o timão, o navio fica à deriva.
(Matthieu Ricard)
Yoga é emancipação da consciência. A consciência quase sempre está direcionada a algo exterior a ela mesma. Quando ela se fixa naquilo que não é ela mesma, ela se limita em seu alcance e profundidade, e estancamos em nossa evolução espiritual.
Seduzida e fascinada pelos objetos da percepção sensorial, a consciência ata-se às coisas do mundo e sujeita-se aos condicionamentos da mente, como se “isso tudo” fosse ela mesma. Em tal condição, a consciência encontra-se capturada pelo emaranhado do fluxo mental.
No estado de vigília, a consciência se prende e se perde nos acontecimentos circunstanciais da vida. Nos sonhos, ela vaga entre as fantasias do real e as quimeras que lhe assombram. Mas ela também pode perder-se em devaneios e, em estados alterados, sofrer de delírios e alucinações.
A consciência, assim, está quase sempre fora de si mesma, fixa a algo que não é ela mesma. Esteja direcionada às preocupações do “mundo exterior” ou às imagens que fluem do “mundo interior”, a consciência mantém-se submetida às atividades da mente. A mente, assim, controla a consciência e dita-lhe o rumo a seguir.
A mente é um fluxo ininterrupto de pensamentos. Quando a mente está no comando, a consciência está obstruída para “ver além” do que a mente lhe mostra. Atrelada à mente e ao seu fluxo ininterrupto de pensamentos, a consciência apenas "vê" as projeções da mente. Ela, segue, assim, unificada com a mente e seus condicionamentos.
Uma metáfora interessante nos ensina sobre a consciência e a mente. Ela se refere a uma carruagem conduzida por um cocheiro e um cavalo. Nesta metáfora, o cocheiro e o cavalo, são, respectivamente, a consciência e a mente.
Se o cocheiro segurar firme as rédeas e conhecer o cavalo, ele saberá conduzir o cavalo na direção correta. Se o cavalo for bem domado, tranquilo e obediente, ele levará a carruagem em segurança, confiando na guia do cocheiro.
Por outro lado, um cavalo inquieto, atormentado ou excitado, não obedecerá às ordens do cocheiro. Ele simplesmente sairá em desabalada carreira, totalmente selvagem, arredio e cabriolando, sem que o cocheiro lhe possa pôr os devidos freios.
E como um cocheiro disperso, desatento, perdido em meio a preocupações, sem conhecimento do cavalo e firmeza nas mãos, poderá dominar um cavalo inquieto e excitado?
A metáfora nos ensina que uma consciência que não está atenta ao que se faz no aqui e agora, não é capaz de nos conduzir por caminhos seguros na vida. E uma mente inquieta, centrada no próprio fluxo de pensamentos, acaba dispersando a consciência, que se perde nas mazelas da mente e se aprisiona ao seu fluxo de pensamentos.
A mente inquieta, que com toda certeza fará muita estupidez na vida, também pode ser comparada a um macaco louco. Essa mente, cativa de si mesmo, é como um macaco agitado que, solto na floresta, pula de galho em galho, não se assenta em lugar algum, não sossega nunca. Essa mente “macaco louco” é a mente perturbada pela sua própria atividade.
Essa mente perturbada, como já dito, aprisiona a consciência em seu fluxo de pensamentos. A consciência se fixa nos "problemas da mente", em seus desejos, apegos e aversões. Dispersa e obstruída pela mente, a consciência não resplandece a si mesma. Voltada para “fora de si mesmo”, a consciência se fragmenta, associa-se à mente e agita-se, tentando acompanhar os incessantes "pulos do macaco louco".
O estudo e a prática do yoga trazem a consciência de volta a si mesma. É somente quando permanece em seu estado original, de pureza, integridade e serenidade, sem a influência e o domínio da mente e seu fluxo incessante, que a consciência resplandece a si mesma.
É essa luz resplandecente da consciência que guia a mente por veredas tranquilas e suaves. Ao refletir a luz da consciência, a mente torna-se pura, íntegra e serena, tal qual a consciência. A mente, guiada pelo facho luminoso da consciência, aplaca sua inquietude, reduz o fluxo incessante de pensamentos, e mantém-se atenta ao aqui e agora.
A mente “macaco louco” jamais nos conduzirá por caminhos seguros, belos e tranquilos; ela pode, inclusive, se transformar em um problema sem solução. É a mente “cavalo domado” que está apta a nos levar, com segurança, alegria e tranquilidade, em direção ao "sol da sabedoria".
Então, emancipe a sua consciência; libere-a do fluxo da mente. Para isso, mantenha o corpo quieto, em uma postura firme e confortável; e concentre-se no ritmo de sua respiração, apenas isso. O domínio da respiração tranquiliza a mente, liberando-a da tensão excessiva de sua atividade.
A prática da “respiração consciente” é o primeiro e decisivo passo para emancipar a consciência do controle e domínio da mente. É a consciência que regula e tem autoridade sobre a mente; e não o contrário.
Yoga, você já sabe: estude, pratique.
Hari Om Tat Sat.
O estado de sono profundo acontece quando a consciência transcende o fluxo mental e, assim, pode repousar em si mesma, em sua pureza, integridade e serenidade. Porém, quando desperta do sono, retornando à vigília, a consciência se fragmenta novamente, se agita e se esquece de sua natureza pura, íntegra e serena (Brahma Sutras 3.2.7 e 3.2.8)
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