A consciência não pode existir com dualidade, e a mente não pode existir sem dualidade. Se você for para fora, você entrará no muno da dualidade; se você for para dentro, você se moverá para o mundo da não-dualidade
(Osho)
Dualidade significa dizer que a natureza apresenta uma dupla qualidade, ou seja, que ela é constituída de princípios ou substâncias que são antagônicos entre si. A dualidade parece uma realidade incontestável àqueles que ainda não alcançaram a compreensão de que a existência constitui-se em uma totalidade. Portanto, a realidade, embora se apresente ao nosso entendimento como dualista, em verdade é uma completude universal, que a tudo abarca, perpassa, permeia.
A dualidade é uma deformação no modo de entender a completude da realidade. Desde cedo, nossos pais, professores, religiosos e políticos nos ensinaram que tudo tem o seu lado oposto: dia/noite, pai/mãe, branco/preto, sol/lua, bom/ruim, prazer/dor, alegria/tristeza, vida/morte, deus/diabo, ganhar/perder, sucesso/fracasso, dentro/fora, eu/você, nós/os outros, etc. Tudo muito bem definido e diretamente associado às escolhas que faremos em relação ao nosso futuro, se estaremos do “lado certo ou do lado errado”.
Esses opostos, em si mesmos, apenas se complementam, não se excluem; porém, por não entendermos a realidade, fazemos dos opostos um antagonismo implacável. Isso torna a nossa vida limitada e frustrante, e muitas vezes reagimos com raiva e ódio quando somos adeptos de “um dos lados” em detrimento ao outro.
Mas a dualidade é apenas um modo operacional da mente. A mente é dual, pois uma de suas funções é perceber as sensações do corpo físico, originadas do ambiente, e então analisar, identificar, interpretar, categorizar e arquivar as informações geradas nesse processo. Tudo isso é transformado em linguagem, para que o corpo se expresse pelo seu principal sistema de comunicação, ou seja, a voz.
Portanto, todo dualismo não passa de uma construção mental. A depender da quantidade de informações armazenadas e, principalmente, da qualidade das experiências que originaram essas informações, a mente cria objetos que se opõem uns aos outros. É como se existissem forças antagônicas que agem sobre um mesmo objeto, pessoa ou circunstância, de modo que a realidade se apresenta como “isto ou aquilo”, “é ou não é”, “sim ou não”. E então, nesse emaranhado de dualismos, em meio à pressão social, o que resta aos incautos é fazer escolhas...
O dualismo nos coloca diante de uma questão muito interessante. Trata-se dos dois mundos, que são os domínios das nossas experiências: o mundo interior e o mundo exterior. O mundo interior é o domínio do espírito, e que se contrapõe-se ao mundo exterior, o domínio da matéria. O mundo interior é onde o ser humano readquire a consciência de si mesmo (de quem ele é em essência). “Conhece-te a ti mesmo”, do filósofo grego Sócrates (séc. V a.C.), é a exortação máxima à busca espiritual que se faz pela via do mundo interior.
Já o mundo exterior, é o palco onde vivenciamos as miríades de manifestações da criação. É por concentrar sua atenção no mundo exterior, que o ser humano parece ter se perdido no excesso das atividades fruitivas que caracterizam o mundo da matéria. Se a consciência é a bússola que nos guia ao mundo interior, a mente é o instrumento que dirige nossas ações no mundo exterior. Porém, na consciência não há dualidades, e é pela consciência que se dá o conhecimento da realidade tal qual ela é; já a mente, como vimos, é a produtora e guardiã das dualidades. Não se alcança o conhecimento da realidade, portanto, pela via mental.
Entretanto, esses dois mundos não são separados e, tampouco, diferentes. O que faz parece-los separados e diferentes, é o próprio estado mental que se fixa na dualidade. A mente, atrelada ao dualismo, não se encontra em seu estado natural; ao se fixar nas dualidades, a mente indica que está operando de modo equivocado. Pois o estado natural da mente é de serenidade e harmonia. A mente tranquila permite à consciência iluminar a realidade e, assim, tudo transparece tal como é. E a dualidade, como vimos, é irredutível: ela não aceita nada que seja contrário ao que foi determinado. Quando o dualismo se fixa na mente, a realidade não pode ser vista tal como é, pois a mente se sobrepõe à realidade a partir de seus dos conteúdos mentais dualistas.
Logo, a mente condicionada pelo dualismo, torna-se obscurecida pela ignorância. Quando a realidade é sobreposta, o que se enxerga e se entende é apenas mais do mesmo, isto é, a nossa própria ignorância. Embora a mente seja o instrumento para se conhecer o mundo exterior, esse conhecimento somente será possível quando o instrumento não apresentar avarias. Uma mente condicionada pelo dualismo, é uma mente danificada.
Reparar a mente, livrá-la do dualismo, é fundamental para que se restabeleça a conexão harmônica entre o mundo interior (o espírito) e o mundo exterior (a matéria), pois a mente é a ponte que os une. Os dois mundos se constituem em uma mesma realidade. Se a ponte se quebra, perdemos a compreensão de que “o que está dentro, está também fora; e o que está lá, também está aqui”. Desconectados do mundo interior e fixados na dualidade, nossa percepção mental falha em sua leitura da realidade.
Ora, se “o que está dentro, está também fora”, isto quer dizer que o inferno existe antes em nossa mente, e que o mundo exterior apenas reflete esse estado mental infernal; o nosso comportamento é decorrente do nosso estado mental. O mesmo é válido para o paraíso.
Somente, pela prática constante do yoga, a percepção correta da realidade será restabelecida, e não haverá mais a sensação de separação e diferença entre todos os seres. O dualismo será superado. Ninguém mais dirá que é pela guerra que se alcança a paz, extrapolando a linguagem para uma dualidade paradoxal. Pois se alguém assim o diz, você já sabe: a guerra está na mente de quem assim o diz. Se você deseja a paz, viva em paz.
Toda dualidade é uma criação da mente, toda dualidade é criada pela mente apegada. Quando não há apego não há dualidade. Quando você quer que algo aconteça de acordo com você, e isso não acontece, surge a dualidade. Quando você está pronto para relaxar com tudo como acontece, onde está a dualidade? Alguém te insulta e você agradece. A riqueza vem e você gosta. E um dia você é pobre e gosta da pobreza. Onde está a dualidade? Se você pode desfrutar de tudo o que acontece, se você pode apreciar as rosas que estão sempre lá e você não conta os espinhos, então onde está a dualidade? Então, a mente se torna não-dual. Então todos os fragmentos desaparecem; então uma grande unidade surge em você
(Osho)
Hari Om Tat Sat.
Comments