Tudo o que existe surge da consciência. Eis porque tudo não passa de sonhos ilusórios, de manchas imaginárias que caem diante dos olhos. Por que vamos nos cansar correndo atrás delas? (Linji Yuxian)
Nascido em Cao, na província de Shandong, o chinês Linji Yuxian, o Mestre Linji, foi um monge budista que viveu durante a Dinastia Tang, no século XI. Muito influente em sua época, Linji, desenvolveu um estilo próprio para transmitir os ensinamentos do Zen budismo, fundando, em 853, o seu mosteiro.
Seus métodos direcionavam-se para uma abordagem simples e direta. Seus ensinamentos eram acompanhados de gritos, tapas e palavras ríspidas, não aceitando nenhum tipo de especulação filosófica. Mestre Linji acreditava na prática intensa e na iluminação instantânea.
Os modos drásticos de Linji tinham como objetivo chocar seus discípulos, despertando-lhes de seus condicionamentos limitados. Ele acreditava que qualquer pessoa, independente de seu nível intelectual ou condição social, estava apta a alcançar a iluminação espiritual, desde que estivesse disposta a isso.
Para Linji, a meditação era a via principal para o despertar da consciência sobre a natureza da mente. A natureza da mente, conforme os ensinamentos budistas, é iluminada, plena, vazia e serena. É o acúmulo de conceitos, palavras e imagens que condicionam a mente, e encobrem sua real natureza de clara percepção da realidade.
Dizia o Mestre Linji aos seus discípulos: “No meu entendimento, não há muito a fazer. Apenas fazer as coisas corriqueiras – vestir as túnicas, alimentar-se e passar o tempo todo sem fazer nada.”
O que ele queria dizer é que, procurar a iluminação nas coisas de fora, era perder o precioso tempo. As coisas de fora encaminham a pessoa na busca por metas ou objetivos. Quanto mais uma pessoa busca realizar metas, maior será o seu sofrimento, pois sejam quais forem suas conquistas, nada poderá satisfazer-lhe plenamente, já que sempre haverá um novo objetivo, outra meta a conquistar. Por isso, exortava Linji, “melhor é não fazer nada”.
Ele chegou a essa conclusão após acompanhar monges que estudavam muito, porém, os conhecimentos obtidos pelo estudo, não os levavam à iluminação. Pelo contrário, apreciavam o estudo com a intenção de obter prestígio e alcançar posições superiores na hierarquia dos mosteiros.
Para Linji, a pessoa sem objetivos era aquela que alcançava a iluminação. Pesquisar e questionar o tempo todo, era um desperdício de tempo, assim, acreditava Linji. Mas isso não quer dizer que o estudo deva ser desprezado, porém, que não haja um objetivo final, uma meta a se alcançar; pois a iluminação se encontra no viver plenamente o momento presente.
Assim, a pessoa sem objetivo é aquela que não persegue a iluminação, não faz disso um objetivo, cujo resultado, ao ser alcançado, lhe trará algum tipo de benefício particular. Tal pessoa, não se apega a teorias, mestres, ensinamentos, e nem mesmo à iluminação; ela, simplesmente, nada busca, apenas deixa de perseguir objetivos e segue o fluxo da vida.
Para Linji, essa é pessoa autêntica, aquela que habita soberana no interior de cada indivíduo. Somente esta pessoa pode viver o momento presente, pois ela não se deixa levar por preocupações ou expectativas, nem por pensamentos, ideias, emoções ou projetos. São essas coisas que dificultam o despertar da consciência para a verdade da natureza da mente.
Buscar Buda, Cristo ou Deus, é apenas perseguir ideais, muito distantes da realidade. Buda e Cristo não passam de sombras, são pessoas que viveram e morreram, não há como encontrá-las exteriormente, por mais que se procure; Deus é uma ideia, e a ideia de Deus, Buda ou Cristo que cada um forma em sua mente, por fim, se transforma no maior obstáculo para a felicidade.
Mestre Linji, como dito, era simples, direto e drástico. Se buscamos o fantasma de Buda ou de Cristo, quando o encontramos, devemos decepar-lhes a cabeça, pois não passam de ideias e amontoados de palavras; temos que abandonar todas as opiniões que temos disso ou daquilo, e todas as crenças que limitam a percepção correta da existência.
Temos que compreender que os ensinamentos de um Buda ou Cristo, não são palavras que existem fora de nós, confiscadas em “livros sagrados”, que apenas os sacerdotes sabem interpretar; elas são os meios para curar-nos da ignorância, do ódio, das frustrações e da ansiedade que nos domina.
A iluminação não se encontra naquilo que está escrito, nem naquilo que dizem os sacerdotes; ela está na lucidez do momento presente, em ver aquilo que ninguém vê, em nada julgar ou discriminar.
Para o Mestre Linji, a pessoa sem objetivos é a verdadeira pessoa participante ativamente da vida; ela contribui para a melhoria do seu ambiente, mas não se deixa envolver por nada, não se deixa oprimir por nada. Ela vive como uma pessoa comum, mas é soberana de si mesmo; e onde quer que esteja, esse é o lugar do seu despertar.
Assim é na meditação: sentar e esquecer. Esquecer-se de si mesmo e, atento a cada respiração, aprofundar-se na consciência do Si Mesmo. Parado, porém, em contínuo movimento em direção ao Ser. Na quietude do corpo e no silêncio da mente, Mestre Linji nos exorta a viver livremente; e essa libertação, por si só, contribuirá para a libertação de outros.
Hari Om Tat Sat.
Se ficais por aí procurando alguém de quem aprender a prática, mesmo que estudeis por eras infindáveis, ainda estareis indo e vindo no mundo do nascimento e morte. Não discrimineis contra nada. As aflições surgem na mente. Se não ficais presos a palavras e rituais, a iluminação acontecerá espontaneamente. Sejais como a pessoa que nada tem a fazer quando entra no templo, que senta-se e esquece (Mestre Linji)
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