Então, veremos que somos infalivelmente guiados à Meta, que tudo tem um sentido, mesmo as coisas mais insignificantes – que nenhum detalhe se move sem que tudo se mova – e que nós nos encontramos a caminho de uma aventura bem maior do que havíamos imaginado (Satprem)
O yoga é um processo de plena compreensão de quem somos, onde estamos, porquê estamos e o que fazemos. Quando essa plena compreensão da existência emerge, então o processo de yoga se realiza. Yoga, portanto, é um caminho que, percorrido com sinceridade e autenticidade, nos permite a evidência da realidade que se oculta por detrás dos fenômenos da existência. Essa evidência da realidade oculta nos sobrevém apenas pelo despertar da consciência, cuja luz irá iluminar cada vez mais todo o obscurecimento que não nos deixa ir além das aparências.
O yoga, assim, é o despertar da consciência. A consciência, despertada pelo processo do yoga, inicia a sua jornada rumo ao autoconhecimento e à sabedoria. Podemos dizer que yoga é a aventura da consciência em seu percurso da Terra ao Céu, do Humano ao Divino. É a consciência que nos permite ver além das aparências; e ver além das aparências, é ser capaz de perceber que em todos os seres e fenômenos há uma essência. Há algo que une a tudo e a todos; e essa unidade subjacente à diversidade é o que constitui a teia da vida, aquilo que ata tudo e todos.
O ser humano é um complexo constituído de dois pares de dois elementos, indissociáveis e inter-relacionáveis: (1) corpo-mente e (2) alma-espírito. Simplificando, o corpo é aquele que age, que atua; enquanto a mente elabora, projeta, interpreta. A alma é a presença que a tudo testemunha. O espírito é a energia que infunde a vida, que fertiliza, que faz viver. Espírito quer dizer “sopro”. O “sopro da vida”. Enquanto há vida, há inspiração e expiração. Quando o espírito se retira, a vida se esvai: o corpo tomba, a mente se dissolve e alma carrega as marcas deixadas pela vida.
É pelo corpo-mente que a alma experiencia o mundo: prazer e dor, alegria e tristeza, apego e aversão. Porém, quando a alma se enreda nas aventuras do corpo-mente, ela cai no sofrimento. Porque corpo-mente estão fadados à dissolução. Eles não perduram. Hoje temos um nome e uma forma. Mas isso não vai perdurar. Uma das verdades da Existência é que tudo passa, tudo muda, tudo se transforma, tudo evolui. Não há como contestar essa evidência. Corpo-mente são aspectos transitórios e impermanentes. Na Natureza, expansão e retração são movimentos espontâneos, cíclicos. Tudo ora vai, tudo ora vem. Basta observar com atenção.
Quando a alma se identifica com as aventuras do corpo-mente escapa-lhe à consciência de sua real essência. Pois, se corpo-mente são transitórios e impermanentes, surgem e desaparecem no tempo, assumindo uma infinitude de nomes e formas diferentes em tempos diferentes, por outro lado, a alma é eterna, imutável, imortal. O sofrimento que a alma experiencia nada mais é do que resultante de sua identificação com as ações do corpo-mente. Quando a alma toma para si dor e prazer, alegria e tristeza, apego e aversão, como se isso lhe pertencesse, o sofrimento é inevitável.
Yoga significa unir. Porém, antes de unir, no decorrer do processo, o yoga leva à desidentificação. A alma deve permanecer livre para que possa desfrutar das aventuras do corpo-mente, sem nelas se perder. Por isso, em sua essência ela é a testemunha da existência. Quando a alma sofre é porque ela se apartou de sua essência. Identificada com o corpo-mente, com ações, emoções e pensamentos, a alma se esquece de sua natureza constitutiva. A consciência de Si Mesmo fica obscurecida e a alma entra em uma espiral descendente de medos, ansiedades, preocupações e angústias.
O despertar da consciência nos traz o desprendimento e a desidentificação com as experiências do corpo-mente. Pelo processo do yoga, a consciência se revelará quando, sem deixar de participar da vida, não julgamos nada. Pois sabemos que tudo passa, tudo muda, tudo se transforma. É manter a equanimidade em todas as circunstâncias da vida. Diz o Bhagavad Gita:
Assim como a alma incorporada experimenta infância, maturidade e velhice dentro do mesmo corpo, assim ela também passa de corpo a corpo. Mas quem permanece sereno e imperturbável no meio do prazer e do sofrimento, somente esse é que atinge a imortalidade.
Viver a vida sem se deixar arrastar pelos acontecimentos, agradáveis ou desagradáveis. Aprendemos isso com muita dificuldade, quando aprendemos. Não temos controle sobre o fluxo dos acontecimentos da vida. Porém, podemos aprender a dominar as nossas reações; podemos aprender a agir sem desespero. Podemos aprender a serenidade e a confiança. Esse aprendizado nada mais é do que relembrar de quem somos, onde estamos, porquê estamos e o que fazemos.
O processo do yoga nos leva à consciência. A consciência a tudo permeia e perpassa. É como uma luz que a tudo ilumina. É a luz da consciência que torna a mente iluminada. Consciência, portanto, é manter uma atitude equânime e imparcial perante os fatos da vida e os fenômenos da existência. É ser constante na virtude da serenidade. Diz o Bhagavad Gita:
Indestrutível é aquilo que permeia o Universo todo; ninguém pode destruir o que é imperecível, a Realidade. Perecíveis são os corpos, esses templos do espírito; eterna, indestrutível, infinita é a alma que neles habita.
Quando é que lembramos de que estamos vivos? Quando estamos conscientes disso. O yoga é uma realização contínua e prolongada que nos mantém atentos à recordação primordial de quem somos, onde estamos, porquê estamos e o que fazemos. Cada postura, cada respiração, cada momento de interiorização é para não deixar que essa lembrança se dissipe da nossa alma. Pois estamos aqui de passagem. Nada termina aqui. É apenas uma etapa da aventura da consciência.
Por mais intensa que seja a minha experiência, estou cônscio da presença e da crítica de uma parte de mim, que, como se não me pertencesse, fosse um expectador sem nenhuma participação na experiência, apenas anotando-a; e esta parte de mim não é mais ou menos do que é vós. Quando chega ao fim a comédia ou, quem sabe; a tragédia da vida, o espectador vai-se embora. Até onde lhe dizia respeito foi uma espécie de ficção, uma simples obra de imaginação (Henry Thoreau).
A partir da próxima semana, teremos um encontro marcado, todas as quartas-feiras, às 12h, com os ensinamentos do Yoga de Patañjali. Fique conosco!
Hari Om Tat Sat.
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