Uma nuvem branca é um mistério, o vir, o ir, o próprio ser dela. Uma nuvem branca não tem nenhum caminho próprio. Vagueia. Não tem onde chegar, não tem objetivo, não tem destino a ser cumprido, não tem fim. Você não pode deixar uma nuvem branca frustrada, porque onde quer que ela chegue, é a meta. Uma nuvem branca deixa-se levar para onde quer que o vento a dirija — não resiste, não luta. Uma nuvem branca não é um conquistador, e mesmo assim flutua acima de tudo. Você não pode conquistá-la, não pode vencê-la. Uma nuvem branca não tem para onde ir. Movimenta-se, vai para todos os lugares. Todas as dimensões lhe pertencem, todas as direções lhe pertencem. Não rejeita nada. Tudo é, existe, em total aceitação
(Bhagwan Shree Rajneesh)
Todos buscam um caminho a seguir na vida. Em nossa jornada terrena, trilhamos por inúmeras veredas, pois sempre temos em mente uma meta a alcançar, um objetivo a cumprir. Muitos desses caminhos são trilhas surradas, desgastadas por tantos pés que por elas passaram, que nelas pisaram; por tanto serem pisoteados, o solo desses caminhos tornou-se duro e seco, e ali nada mais brota, nada frutifica nesse chão árido a não ser a dor e o sofrimento de um esforço frustrante. Esses são os caminhos das gentes, os caminhos do mundo, caminhos que parecem nos conduzir ao alto, mas que nos levam morro abaixo. Quem nunca passou por eles?
Um caminho a seguir na vida é o que todos buscam. Há o caminho da felicidade, o caminho da paz, o caminho da luz, o caminho do sol, o caminho da fé, o caminho do dinheiro, o caminho da fama, o caminho do sucesso, o caminho da família, o caminho da política, o caminho do trabalho, etc., etc., etc. Todos esses caminhos – caminhos das gentes, surrados – já sabemos onde nos levam. Saber onde nos levam não quer dizer que chegaremos ao seu final; pois todos eles têm um propósito, uma meta a ser alcançada, um objetivo a ser realizado. Cada um deles tem sua própria estratégia, seus métodos, técnicas e exigem capacidades e habilidades específicas.
Muitos desses caminhos se entrecruzam, se confundem e, na ânsia de sermos bem-sucedidos, forçamo-nos, quase sempre, a seguir por atalhos que, a princípio, são tentadores e promissores. Porém, quando a consciência emerge, percebemos o quanto esses atalhos nos fizeram caminhar ainda mais sem que chegássemos ao lugar que queríamos. A meta ficou distante e o objetivo quase impossível de ser realizado. A sensação é a de que nos perdemos na vida, por seguir tantos caminhos que pareciam ser corretos, mas que se revelaram controversos, antagônicos e desarmônicos naquilo mesmo para onde nos prometiam conduzir. É como se caminhássemos mil milhas em uma esteira ergométrica: caminhamos muito, é verdade, mas não chegamos a lugar algum.
Esses são os caminhos das gentes, os caminhos do mundo. Como dito, todos eles são direcionados a uma meta, um objetivo; eles conduzem a algo que está distante, no futuro, algo a ser conquistado. Muitas vezes, fazemos desses caminhos o propósito de nossas vidas, a missão a ser cumprida por nós nessa vida terrena. Esses caminhos, para serem percorridos, necessitam de um projeto, de um planejamento, de uma visão do futuro, pois é para o futuro que eles pretendem nos levar. Porém, qualquer caminho, na acepção do termo, é um local de passagem, o que indica um deslocar-se ‘daqui para lá’, num percurso já trilhado por outros. Um local de passagem, por mais batido que seja, o imprevisível e o imponderável são fatores que nunca podem ser descartados. Afinal, um caminho tem início, meio e fim; e somente temos certeza do início, ao darmos o primeiro passo; daí em diante, tudo é incerto, por mais confiança e convicção que possamos ter em nossa proposta de seguir adiante.
Todos esses caminhos do mundo, nada mais são, do que manifestações do nosso desejo de ser, de ter, de fazer. Quando desejamos algo, nossa mente põe-se a projetar o futuro. Projetar o futuro e remoer o passado, são os extremos por onde a mente se move. Mas a mente que se move entre esses extremos, é uma mente que está a serviço de si mesmo. É uma mente condicionada por estímulos repetidos ao longo de muitos anos; então, ela, a mente, assume o controle da nossa vida, e faz dos nossos desejos a sua missão a cumpri. Essa mente, assim programada, pode tornar-se impetuosa e obstinada, reagindo, muitas vezes, de modo presunçoso e exaltado. Quando a mente põe-se a caminho de algo, no piloto automático, é difícil detê-la.
Agora, olhemos para o céu num dia de nuvens – e observemos as brancas nuvens de algodão. Vamos observá-las: de onde elas vêm e para onde irão? Não sabemos. Elas não deixam rastros de onde vieram e, quando passam por nós, até acreditamos saber para onde estão indo; porém, sem qualquer aviso, elas, simplesmente, se desmancham lentamente. Assim como surgiram, desapareceram. As nuvens brancas não seguem nenhum caminho, tampouco projetam uma direção; apenas seguem para onde o vento as levam, como se nada mais importasse a não ser, naquele momento, ser apenas uma nuvem branca a vagar, suave e serena. As nuvens brancas seguem o fluxo da natureza e, imperturbáveis, nada lhes pode provocar nenhum mal. Enquanto vagam como nuvens brancas, livres, desfrutam do momento, com forma; quando se desmancham, e se espalham, continuam a desfrutar do momento, sem forma.
Seguir o “caminho” das nuvens brancas, portanto, é seguir o fluxo da naturalidade; é seguir sem ter um caminho a seguir, não ter ponto de partida e nem ponto de chegada. Como as nuvens brancas, não importa de onde viemos ou para onde iremos, pois o lugar em que estamos é o lugar onde devemos estar no momento. As nuvens brancas não dizem aos ventos: “queremos ir para lá ou para acolá”. Elas não determinam nada para si mesmas, não traçam o próprio destino e se lançam em louca jornada; apenas aceitam, confiam e entregam-se a algo maior que elas, e são gratas por desfrutar dos seus momentos de nuvens brancas.
Quando traçamos o próprio destino, temos que nos esforçar muito para alcançar a meta e o objetivo. Fazer força, bater o pé no chão e ser duro e decidido, além de ferir o solo sagrado da Terra, é querer mudar o rumo das coisas conforme os interesses próprios; mas a vida, em sua totalidade, é muito mais do que o interesse de um único indivíduo. As nuvens brancas não precisam saber qual o seu destino; elas, simplesmente, se colocam a serviço da natureza. Enquanto brancas, refletem a luminosidade do Sol, nos ensinando que a nossa alma, igualmente deve refletir a luz da Presença suprema que habita em nós.
Se “deixar levar”, como as nuvens brancas, quer dizer dispor-se à naturalidade dos acontecimentos. Se tudo tem uma causa ou não, o que importa? Se não resistirmos ao fluxo da vida, tudo será conforme tem que ser, nem mais e nem menos. Mas, se fizermos oposição à corrente da vida, então, seremos arrastados pelo turbilhão dos acontecimentos. É como cair na correnteza de um rio e ficar se debatendo para não se afogar; se ficarmos quietos, se nos soltarmos na água, se nos deixarmos levar relaxadamente, estaremos a salvos. Quem se debate no fluxo da vida, fica pesado, e afunda; quem se solta e segue o fluxo, fica leve, e flutua. Observemos as nuvens brancas: elas sempre pairam no ar, flutuam vagarosamente, parecem imóveis; e não necessitam de nenhum esforço para estar acima de tudo.
O movimento é a essência da vida. Naturalmente, nos movemos, assim como as nuvens brancas. Mas quando permitimos que a mente assuma o controle e interfira no fluxo da naturalidade, somos arrastados pelos desejos e aversões da mente. Movimentar-se entre o passado e o futuro é mover-se no tempo e no espaço. Então, esse mover-se entre os extremos – vida e morte, desejo e aversão – tem que ser significativo, tem que ter algum propósito, um sentido, seja ele qual for; temos que almejar algo que nos impulsione ao futuro para não ficarmos presos ao passado, ou entraremos em desespero, ficaremos entediados, ansiosos e deprimidos.
As nuvens brancas se movem em uma dimensão atemporal, pois para elas não há preocupações com o passado, tampouco nada a almejar no futuro. Uma nuvem branca sempre está no “aqui e agora” do momento presente, vivenciando a eternidade. Sim, basta apenas estar presente, pois cada momento que se vivencia é o próprio fluir da eternidade. Se nos movermos como as nuvens brancas, não necessitamos de meta a alcançar, e muito menos algo será perdido. A nossa meta é o lugar onde estamos, não um ponto no futuro, uma marca que devemos alcançar em algum lugar no tempo e no espaço. A meta, o objetivo, o sentido da vida, o significado da existência é vivenciar plenamente o “aqui e agora”, pois o momento presente é a dádiva da vida, e a única coisa que nos é permitido desfrutar sem nada temer, nada a desejar.
Quando a mente se movimenta entre o passado e o futuro, perdemos a dádiva da vida. Não temos consciência de que a vida se esvai, que a nossa energia vital se esgota rapidamente em movimentos desarmônicos, antagônicos, controversos. E nada percebemos, pois a meta e o objetivo estão em algum outro lugar que não onde estamos, e devemos nos movimentar para esse lugar, para conquistar a meta, realizar o objetivo. Se nos movimentamos assim, erguemos uma barreira quase intransponível entre o que já somos e o que estamos lutando para ser. Mas vejam bem: o que estamos lutando para ser, nós já somos, mas não percebemos, pois qual barco sem leme num mar revolto, somos lançados e sacudidos entre os extremos dos vários caminhos do mundo. E o presente, esse momento eterno, nunca é presenciado.
Lembremos das nuvens brancas: elas não têm um destino a cumprir, nenhum caminho a seguir. Não se fixam a qualquer meta, propósito ou objetivo. Onde elas estão, onde quer que os ventos as levem, essa é a meta. O fluxo da vida as conduz para onde e quando devem estar. Quando permitimos que a nossa mente se fixe em um caminho e para ele se oriente, estamos destinados à frustração. As nuvens brancas nos ensinam que um caminho a seguir não é um percurso traçado, com uma seta indicando o rumo, literalmente, para onde devemos ir; as fixações nos causam dor e sofrimento.
O caminho das nuvens brancas se faz a cada dia, no passo a passo, no compasso da naturalidade; sem desespero, sem temor pelo futuro, sem medo do passado. Se seguirmos assim, conscientes da jornada da vida, desfrutaremos da harmonia e da serenidade em cada momento vivido.
Uma vez que esse estado é revelado, uma vez que é compreendido, uma vez que você se torna consciente dele, o maior mistério do ser é revelado — todo o mundo é perfeito — Isto é o que queremos dizer quando falamos que todo mundo é a alma, a alma suprema, o Divino. Isto é o que queremos dizer quando falamos Tat Tvam Asi — “eu sou isso”. Não precisa se tornar, porque se tivesse que se tornar, então não seria. E se você já não fosse, como poderia vir a ser? A semente torna-se árvore porque a semente já é isso. Uma pedra não pode transformar-se numa árvore. A semente torna-se árvore porque a semente já é isso! Assim, a questão não é de transformação, a questão é apenas de revelação. A semente revela-se neste momento como uma semente; no momento seguinte, como uma árvore. Portanto, esta é apenas uma questão de revelação. E se você puder penetrar nisto profundamente, verá que a semente já é a árvore neste exato momento. Que você já é o que está lutando para ser
(Bhagwan Shree Rajneesh)
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