Jesus viu Natanael vir ter com ele, e disse dele: Eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há dolo. Disse-lhe Natanael: De onde me conheces tu? Jesus respondeu, e disse-lhe: Antes que Filipe te chamasse, te vi eu, estando tu debaixo da figueira
(v 47-48).
Banyan é uma das centenas de espécies de figueiras que existem no mundo. As figueiras habitam áreas tropicais e subtropicais. Banyan se encontra na Índia, no Sri Lanka e em Bangladesh. As figueiras, são árvores grandes, que podem ultrapassar a altura de vinte metros. São muito frondosas e proporcionam excelente sombra.
A figueira, devido à sua abundância de espécies existentes no Oriente, é parceira dos humanos desde mais longínqua antiguidade, servindo de alimento e uso medicinal. Além do mais, é considerada uma árvore sagrada. Foi meditando à sombra de uma figueira, que Sidarta Gautama, o Buda, alcançou a iluminação espiritual. Assim, dentre uma de suas muitas representações, a figueira é o símbolo da sabedoria e da integridade para os hindus. Porém, mais do que isso, seus significados estendem-se ao de paz e abundância (para os hebreus) e árvore do paraíso (para os árabes).
Entre os egípcios, diz-se que os faraós levavam figos secos às suas tumbas para, assim, alimentar suas almas durante a viagem ao além. Eles também acreditavam que a Hathor, a deusa do Céu e que representava as mães, surgiria de uma figueira mítica para dar as boas-vindas aos mortos, quando estes chegassem ao paraíso.
E nas tradições religiosas africanas, a figueira é onde habita Iroko, o orixá implacável que governa o Tempo e determina o início e o fim de tudo. Iroko é o comandante de todas as árvores sagradas, e a figueira é árvore por onde todas os demais orixás desceram à Terra. A figueira, assim, é a árvore do Senhor do Céu, Iroko.
De um modo geral, as árvores sempre foram consideradas como símbolos sagrados de vitalidade, ancestralidade, transitoriedade, renascimento e espiritualidade. Também representam beleza, força, poder, equilíbrio e crescimento. Todavia, nenhuma outra árvore serviu tão bem como símbolo de referência do que as figueiras.
Eis uma árvore. Se a deixais crescer, ela cresce. Não vos pede ajuda - quer apenas a terra, a água, o ar - e vai crescendo. E o tronco se projeta alto e grosso da base de um encordoamento enérgico de raízes encravadas no chão, e os galhos partem oblíquos, e vão lançando ramas, e eis uma árvore nobre entre as mais nobres, grande, bela e poderosa
(Rubem Braga, Os fícus do Senhor, 1946)
Talvez o fato de serem árvores de grande porte e copa frondosa, capaz de abrigar muitas pessoas do calor do sol, as figueiras sempre foram um local para o descanso dos viajantes. Assim, onde havia uma figueira, o espaço sob sua sombra servia de uso geral para o cotidiano das pessoas que habitavam os vilarejos. Era figueiras, portanto, sempre foram muito populares, constituindo-se em espaços de sociabilidade.
No Brasil, a primeira descrição de uma figueira é de 1648. Martius, um médico, botânico e antropólogo alemão do século XIX, foi um dos importantes pesquisadores europeus que estiveram no Brasil e que observou o uso das propriedades medicinais da figueira entre os brasileiros.
Mas as figueiras, como já dito, serviam a muito mais que isso. Sob suas copas, crianças brincavam, viajantes descansavam, pessoas se reuniam para namorar, tratar de diversos assuntos e até firmar importantes compromissos. Esses compromissos tinham a figueira por testemunha. As figueiras, portanto, cumpriam muito bem a missão dada a elas pela natureza: servir de refúgio, de proteção e acolhimento a qualquer pessoa que assim necessitasse. Muito da vida social acontecia debaixo de uma figueira.
Há uma frase bíblica que diz “te vi debaixo de uma figueira”. Estar “debaixo de uma figueira”, é uma alegoria, que significa que estamos em compromisso com algo, seja nosso trabalho, nossa família ou nossos amigos, e que estamos cumprindo, com sinceridade de propósito, todos os deveres assumidos. Trata-se de alguém que firmou compromisso com a verdade e busca, de todo coração, seguir a senda da espiritualidade.
Estar debaixo da figueira, seja no sentido figurado ou literalmente, representa o lugar ideal para assumirmos o compromisso com a nossa espiritualidade, o melhor lugar para estudar, refletir e meditar sobre a existência, quem somos, e o sentido de estarmos aqui. A figueira simboliza, portanto, o lugar onde o ser humano busca a verdade com sinceridade.
Estar sob a figueira indica que estamos nos dedicando a viver, de todo coração, os princípios mais elevados da espiritualidade. Estamos comprometidos em elevar a nossa consciência ao Ser Interior. A experiência de estar sob a figueira, ou seja, estar vivendo conforme os princípios da espiritualidade, entretanto, não significa que já estamos em comunhão com o Ser Interior.
Para que a comunhão com o Ser Interior se realize, dois obstáculos ainda têm que ser superados: o preconceito e o egoísmo. O preconceito é a dificuldade que temos em aceitar ensinamentos que não se enquadram em nossa tradição religiosa, em nossa cultura, em nosso estilo de vida. Rechaçamos tudo aquilo que não convém ao que já estamos convictos. Embora dispostos a conhecer a verdade, pecamos pela inércia e estreiteza da mente, e nos recolhemos diante da verdade; preferimos seguir nossa tradição e convicção, e ficarmos bem confortáveis à sombra da figueira.
O egoísmo é o mais difícil dos obstáculos. Mesmo quando aceitamos novos ensinamentos, ou seja, quando nos abrimos ao conhecimento, em algum momento iremos nos deparar com o pior dos enfrentamentos a ser superado: vencer a si mesmo. Superar o egoísmo é conhecer a si mesmo, e isso gera grande desconforto.
Conhecer a si mesmo é expor todo o egoísmo que nos domina; é a clara percepção do quanto somos mesquinhos, tolos, maldosos e ridículos. E não é nada fácil reconhecermos o nosso egoísmo, a nossa face de falsidade; daremos muitas explicações e justificativas para negar todas as evidências que apontam, diretamente, para o nosso comportamento egóico.
Para vencer o preconceito, temos que manter a “mente aberta”, ou seja, temos que adotar a atitude de um aprendiz. Um aprendiz pouco sabe, mas tem muita vontade de saber. Ele se dispõe a aceitar o convite para “ver e vê”. Se tem alguma opinião ou crença, ele põe em suspenso e apenas ouve com atenção. Ao “ouvir com atenção”, ele revitaliza a sua capacidade de reflexão e, assim, absorve o ensinamento e transforma-o em uma nova atitude.
O aprendiz, portanto, sempre avança em conhecimento e aperfeiçoa a sua prática; mas aquele que acumulou muitas experiências no decorrer da vida e nelas deposita toda a sua convicção, tende a permanecer estagnado no “mais do mesmo”.
O egoísmo pode ser superado com a atenta observação da mente. Para isso, a atenção deve se voltar ao mundo interior. Observar a mente com atenção é ser a testemunha dos próprios pensamentos e sentimentos. São eles que nos manipulam, que nos fazem reagir automaticamente. Que tipos de pensamentos e sentimentos são recorrentes em nossa mente? O que eles nos dizem? Que ordem eles nos dão?
Pensamentos e sentimentos recorrentes são os indícios da mente condicionada, isto é, do “ser mental” que nos controla. Testemunhar é estar consciente dos conteúdos mentais; é observar, sem participar, dos movimentos do “ser mental”, e perceber claramente para onde ele nos guia: se para o conhecimento e a verdade ou para a satisfação de suas próprias fantasias.
Busquemos, pois, estar sob a sombra de Banyan. A princípio, ele anos trará refúgio, conforto e descanso. Banyan representa a pausa em nossas atividades mundanas para ouvir e refletir. Sob a sombra de Banyan, você terá a oportunidade de dizer “não” aos apelos tresloucados da mente condicionada e, ainda mais, desvincular-se do egoísmo.
Somente pela reflexão você despertará para a verdade e a realidade; e, somente nesse estado desperto, será possível recusar as convulsões do “ser mental” que está a dominá-lo. Ninguém é tão imaturo a ponto de fracassar na senda da espiritualidade, quando se dispõe, com propósito sincero, a conhecer a verdade e a realidade. Descanse à sombra de Banyan e desperte!
Hari Om Tat Sat.
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