Seguindo com a nossa proposta, no artigo de hoje vamos elaborar uma sessão de treino a partir do método intervalado extensivo. Essa seção fará parte de uma semana de preparação visando uma competição de 10 km. Qualquer dúvida sobre o método intervalado extensivo, sugerimos a leitura da parte I desse artigo.
Como já visto, do ponto de vista metodológico, os princípios do treino intervalado são: distância ou duração do estímulo, intensidade, pausa, número de repetições, ação durante o intervalo e atitude mental no surgimento da fadiga. Então, vamos construir a nossa sessão de treino.
A distância utilizada será os clássicos 400m. A intensidade do estímulo (60-80%) será determinada a partir de duas variantes: 1) conforme a melhor marca do corredor na distância de 400m, onde o mesmo deverá realizar um teste na distância; 2) a partir do ritmo médio de corrida na distância de 10 km, onde será determinado o tempo para se cobrir os 400m. O número de repetições, em ambos as variantes, será de 20. Durante a pausa o corredor fará um leve trote de 40-60” na variante 1, e de 10-15” na variante 2. O treino deverá ser realizado, preferencialmente, em terreno plano, para não afetar a intensidade, e com a distância demarcada corretamente. A pista de atletismo, quando disponível, será o melhor local para esse tipo de treino.
O surgimento da fadiga se dá, geralmente, em torno de 60% do treino realizado. Isso significa que, para o corredor que estiver preparado para esse tipo de treinamento, será a partir da décima segunda repetição que ele terá que lidar com o desgaste físico provocado pela redução das reservas de energia nos músculos. À medida que avança no treino, haverá a sensação de que estará fazendo mais força para completar os 400m no mesmo tempo que vinha realizando.
A atitude mental será muito importante nesse momento, pois, a menos que o tempo de pausa não esteja mais sendo suficiente para recuperação parcial, o corredor estará exercitando a tenacidade, a persistência e a determinação. Esses são fatores psicológicos de muita relevância para as disputas competitivas e, também, o que faz o corredor ganhar aquele algo mais na sua condição atlética, já que estará realizando o esforço físico e mental em um estado de crescente fadiga.
Entretanto, se a pausa não está mais sendo suficiente, isso significa que a fadiga está acentuada, e que o esforço está sendo além do que deveria ser. Então, observando atentamente os fatores intensidade/pausa/recuperação, o corredor, deverá tomar a decisão de finalizar o treinamento, preservando a sua integridade física e sua saúde geral.
Esses parâmetros devem ser seguidos à risca, pois são fundamentais para a consecução dos processos dos ajustes fisiológicos e a melhora do rendimento atlético. A distância, as repetições, o tempo destinado à pausa, a intensidade, as ações durante o intervalo e a atitude mental constituem-se na metodologia básica do treino intervalado que estamos propondo.
Vamos à prática!
Pela variante 1, o corredor deverá realizar um “tiro” de 400m como teste de desempenho, anotando a sua marca. Um teste de 400m exigirá do corredor a necessária dosagem do esforço ao longo da distância. Se sair muito forte, é possível que fique pelo caminho já nos 200m; se sair muito lento, terá energia de sobra para um sprint nos últimos 100m. Nenhuma dessas situações corresponderá a um teste válido. Então, qual o parâmetro? A passagem dos 300m, geralmente, é o que determina a qualidade do esforço nesse tipo de teste.
Assim, de um modo geral, até os 300m, aproximadamente, o corredor estará desenvolvendo o seu melhor ritmo de corrida; daí em diante, devido à prevalência do metabolismo anaeróbio, o acúmulo de lactato nos músculos trará muito desconforto; o corredor, não habituado a esse esforço intenso, sentirá suas pernas travando, a passada ficando cada vez mais difícil. Os últimos 50m exigirão um grande empenho para finalizar o teste. Esse teste, devido à sua complexidade, é aconselhável fazer na presença de um treinador, professor de educação física ou alguém que possa auxiliar em uma emergência. Com a marca em mãos, o corredor fará o cálculo para determinar o tempo dos “tiros” no treinamento.
Exemplo para calcular 75% da intensidade (I75)
Teste de 400m = 60”.
I75 = 60 x 100 / 75
I75 = 80
Assim, para o corredor que completar o teste de 400m em 60”, os “tiros” deverão ser feitos em 80” (1min20”). A pausa será de 40-60”. Embora o número de repetições esteja fixado em 20, o corredor deverá observar atentamente a questão da pausa/recuperação, para não ir além do que deveria.
Na variante 2 não será necessário nenhum teste. Como foi dito, o corredor deverá tomar a sua marca atual nos 10 km, calcular o ritmo médio e aplicar ao treino intervalado. Como exemplo, para um corredor que tenha como marca atual nos 10 km o tempo de 45’00”.
Transformamos 45 min em segundos:
45 x 60 = 2700
Depois, dividimos o resultado por 25 (10 km = 25 x 400m)
2700 / 25 = 108 segundos
Ou seja, correr 10 km em 45 min equivale a passar cada 400m numa média de 108 segundos, ou 1’48”.
Na variante 2, não precisamos calcular o percentual de intensidade. Apenas acrescentamos de 6 a 8 segundos na média dos 400m.
Então, para um corredor de 45 min nos 10 km treinar pela variante 2 do método intervalado extensivo, ele fará 20 x 400m entre 1’54” -1’56”, com pausa de 10-15”.
Tanto na variante 1 como na 2, o corredor realizará apena uma sessão semanal, que poderá estar disposta da seguinte maneira na planilha de preparação de base, por exemplo:
Seg – 10 km/ fartlek;
Ter – 10 km/ confortável;
Qua – Treino intervalado;
Qui – 10 km/ confortável;
Sex – Treino regenerativo ou reforço muscular;
Sab – 20 km/ confortável;
Dom – descanso.
Considerações finais
O treinamento intervalado é um excelente meio para o aprimoramento da resistência e da velocidade do corredor, aprimorando o ritmo competitivo. Existem diversas variações na forma de aplicação do treino intervalado, e o que aqui foi exposto é apenas um exemplo prático de como executar esse tipo de treinamento.
O treino intervalado é uma forma rígida de preparação, cujos critérios básicos norteiam o modo de aplicação do método. Portanto, o controle dos parâmetros deverá ser rigoroso para que ocorram as adaptações fisiológicas e o corredor seja favorecido com os benefícios da prática regular do trabalho intervalado.
Devido ao nível de exigência, as sessões de treinos intervalados são frequentemente denominadas de “treino de qualidade”, pois, além do rigoroso controle dos parâmetros metodológicos, o corredor deverá estar atento à biomecânica da corrida (para minimizar o gasto energético) e também aos fatores psicológicos.
Como disse Zatopek, no treino intervalado, o corredor estará sempre testando os seus limites.
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