Svasti Páthah
Om svasti prajábhyah paripálayantam
nyáyena márgena mahim mahísháh |
gobráhmanebhyah shubhamastu nityam
lokáh samastáh sukhino bhavantu || Om shantih, shantih, shantih (Mangala Mantra)
Yajña, no contexto da cultura védica, se refere a qualquer ritual realizado em frente ao fogo. O fogo é considerado um elemento sagrado no hinduísmo, pois é o representante do sol na Terra. Os rituais realizados ao redor do fogo, referem-se a sacrifícios, oferendas e venerações às divindades, onde se busca alcançar um estado de bem-aventurança e harmonia junto as divindades, para a garantia de bem-estar tanto na vida terrena quanto na jornada para o céu, após a morte.
O sol é a divindade denominada Surya, que representa o sol nascente; é aquele que dissipa a escuridão, que fortalece o conhecimento sobre o bem e a vida. Os Vedas afirmam que Surya é o poder de visualizar a realidade; quando somos iluminados por Surya, abrem-se as portas de nossa percepção para aquilo que somos em realidade.
O fogo é a divindade Agni; ele é considerado o mensageiro das divindades, e os rituais realizados em frente ao fogo significam que as divindades acolhem as oferendas dos devotos e lhes retribuem às súplicas.
Rituais em frente ao fogo são considerados como sacrifícios, são compromissos sagrados. Como exemplo, citamos a cerimônia de núpcias no hinduísmo, onde o Agni é a testemunha divina e o guardião da santidade do casamento; se os noivos não derem sete voltas ao redor do fogo sagrado, o casamento não é considerado válido. As sete voltas ao redor do fogo sagrado representam sete compromissos (saptapadi) que os noivos firmam publicamente, fazendo o juramento para que a união seja próspera e feliz.
Outra cerimônia realizada em adoração a Agni é o tradicional rito de passagem que marca a aceitação de um aluno por um guru (instrutor) ou um acharya (sábio). Esse ritual, denominado Upanayana (iniciação) é considerado como o segundo nascimento, ou o nascimento espiritual; trata-se de um jovem que será aceito para estudar em uma escola védica (gurukula), junto a um mestre espiritual conceituado que lhe transmitirá os conhecimentos sobre Brahman (o princípio universal mais elevado e a natureza última da existência).
Mas yajña, para além dos rituais realizados em frente ao fogo sagrado, também diz respeito às obrigações de um chefe de família hindu. Essas obrigações são denominadas de Pañca-mahā-yajñās, que correspondem aos cinco deveres a serem realizados durante a vida de um chefe de família (Grihastha Ashrama Dharma).
É importante entender a tradição por trás dos modos de vida hindu. Pela tradição, existem quatro estágios de vida (ashrama dharma), onde cada indivíduo tem suas responsabilidades, conforme o estágio em que se encontra. Esses estágios e as correspondentes obrigações, refletem o ideal para uma vida honrada e de realização espiritual.
Cada estágio (ashrama) apresenta responsabilidades diferentes, conforme o dever (dharma) a ser cumprido. Essas etapas correspondem aos diferentes caminhos para a obtenção do ideal de uma vida baseada nos preceitos do yoga, ou seja, a liberação (moksha) dos ciclos de vida-morte-renascimento (samsara).
Os quatro estágios tradicionais da vida hindu são:
Brahmacharya, o estágio de estudante, quando o celibato é praticado com o objetivo de focar na educação espiritual junto a um guru;
Grihastha, o estágio da vida familiar, quando o yogi deve cumprir as obrigações familiares e sociais, trabalhando para providenciar para que nada falte à esposa e filhos e para todos aqueles que necessitarem de auxílio;
Vanaprastha, o estágio em que os filhos seguem sua própria vida e o yogi entra na transição das ocupações mundanas para a renúncia, retirando-se da vida social;
Sannyasa, o estágio final, quando o yogi doa suas propriedades, renuncia à família, torna-se um andarilho e se dedica integralmente aos assuntos espirituais e à obtenção de moksha.
O Pañca-mahā-yajñās (os cinco deveres sagrados), portanto, correspondem ao segundo estágio, o Grihastha Ashrama Dharma. Esses deveres dizem respeito à purificação do karma (sattvika karmani), ou melhor dizendo, das ações que realizamos para o bem-estar do maior número de outros seres vivos. É quando nos doamos mais, e recebemos menos em troca; portanto, são os sacrifícios que fazemos para crescermos, espiritualmente, enquanto seres humanos.
As obrigações de um chefe de família, conforme a tradição do yoga (lembrando que esses deveres, quando cumpridos com retidão, auxiliam na busca por moksha), são:
1. Devayajña: adoração da divindade (ishta). Trata-se de sentar diante da divindade para honrá-la com atenção devocional. Entoar um mantra com a sincera intenção de ajudar a todos os seres vivos do planeta é realizar um puja (um ato de reverência devocional);
2. Pitryajña: adoração dos pais e antepassados. Significa respeitar nossos pais e ampará-los em sua velhice. Quanto aos antepassados, todos devem ser tratados com profunda consideração;
3. Brahmayajña: adoração das escrituras sagradas e dos rishis (sábios mestres) que nos legaram as escrituras. Significa que devemos ler regularmente as escrituras, com respeito e devoção, para estudá-las e praticar seus ensinamentos;
4. Manusyayajña: servir à humanidade. Diz respeito ao cuidado com os necessitados, os pobres, os doentes, os inválidos e por qualquer pessoa que necessite de auxílio e o mesmo esteja ao nosso alcance;
5. Bhutayajña: servir a todos os outros seres vivos. Ou seja, é a consideração por toda espécie de vida que existe na natureza, e pela própria natureza.
Os yajñas, como se percebe, possuem uma base ética consistente. Cada vez que realizamos um “ritual de sacrifício” é a oportunidade que nos damos para ir além do egoísmo e reverenciar a vida. Conforme a tradição do yoga, toda a vida deve ser vivida como um “ritual de sacrifício”, onde cada ação realizada seja, em si mesmo, uma oferenda.
Quando assim nos engajamos na vida, quando nossa vida se torna, por si mesma, uma oferenda às divindades, realizamos o dharma, ou seja, cumprimos a nossa missão espiritual na existência terrena. Os deveres não serão mais vistos como uma carga, um ônus, mas um caminho seguro para a prosperidade e a libertação.
Os yajñas cumprem, portanto, o propósito dos ensinamentos védicos, e representam a sua essência, qual seja, nos direcionar para que a nossa vida seja centrada na espiritualidade e na realização do amor, da paz e da felicidade de todos os seres vivos
Invocação da felicidade
Que haja felicidade para todas as pessoas;
que os governantes governem o mundo no caminho da justiça;
que a sabedoria e o conhecimento sejam protegidos;
que todos os seres em todos os lugares sejam livres e felizes.
Paz à mente, paz aos seres vivos, paz à natureza.
(Mangala Mantra)
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