top of page
Foto do escritorMarcelo Augusti

YOGA, A ARTE DE NÃO RESISTIR



Nada barra o caminho para a libertação, ela pode acontecer aqui e agora, e se não acontece é porque você está mais interessado em outras coisas. E você não pode lutar contra os seus interesses. Você tem que deixar-se levar por eles, e vê-los como eles realmente são, até que eles mostrem ser meros erros de julgamento e de avaliação (Nisargadatta Maharaj)



Segundo os mestres autorrealizados na senda do yoga, o despertar da consciência para a iluminação espiritual é algo que acontece sem esforço, espontaneamente.


Mas qual o significado do “sem esforço”? Quer dizer que o adepto não necessita se empenhar nas práticas de meditação? Vejamos essa questão em sua amplitude e profundidade.


Esforço significa aquilo que se faz com dificuldade, com muita exigência e intensidade. É um empenho que, muitas vezes, vai além das nossas forças físicas e psíquicas, deixando-nos exausto e, quase sempre, sem alcançar o resultado esperado.


Esforço quer dizer que a dedicação deve entregar “sangue, suor e lágrimas” ou nunca chegaremos ao objetivo proposto; significa que não devemos desistir jamais, enquanto não conquistarmos as metas traçadas.


Esforço é aquilo que se dirige para fora, para a conquista de algo que se encontra fora de nós. As conquistas materiais exigem, sim, muita dedicação e esforço; muita energia física e psíquica deve ser empregada se desejamos conquistar as coisas do mundo.


O esforço está relacionado a tudo aquilo que o mundo pode nos oferecer e que entendemos como belo, bom e justo. Mas a busca por essas realizações, às quais empenhamos todas as nossas forças, nem sempre são alcançadas; e, mais do que isso, para cada conquista há uma perda de igual proporção, o que significa dizer que o prazer da conquista é sempre acompanhado pela dor de uma perda.


Quando colocamos, exclusivamente, nas coisas de fora a nossa atenção e, nelas, o nosso foco, é porque não compreendemos o mundo e sua realidade; percebemos as coisas do mundo como algo real, aquilo que traz felicidade, e nos esforçamos para conquistá-la.


Então, o sentido da vida parece-nos bem claro: com determinação e afinco, partimos para conquistar as coisas do mundo, pois este é o caminho para a felicidade. Mesmo que os percalços sejam dolorosos e traumáticos, ainda assim, acreditamos, vale à pena prosseguir, sem nunca desistir, pois a vitória é para aqueles que lutam até o fim, sem esmorecer.


Esta percepção, todavia, é equivocada. O mundo é fenomênico; fenômeno é aquilo que surge, dura por um tempo e desaparece. Os fenômenos são transitórios e impermanentes. O mundo fenomênico, portanto, é constituído de coisas que, quando surgem, logo se transformam e não permanecem: a conquista de hoje é o que traz a frustração de amanhã. A felicidade não se encontra naquilo que surge e desaparece.


Mas por que é assim? O mundo é aquilo que está em nossa mente; todas as coisas do mundo são as projeções da nossa mente. O mundo é criação da mente e, como tal, é a sua casa. Quando a mente não se sente realizada em seu próprio mundo ou quando não está feliz em sua própria casa, algo está errado.  


O problema, portanto, não é o mundo em si, mas a nossa mente. A mente guarda na memória todas as impressões de fora; essas impressões compõem o seu conteúdo, que nada mais são do que o material que ela utiliza para dar forma e cores ao seu mundo.


A mente segue a lógica dos algoritmos: ela sempre faz mais do mesmo. O modo como ela percebe o que está fora é de acordo com aquilo que foi acumulado dentro; as impressões que se repetem são agrupadas e tornam-se suas tendências.


Essas tendências se transformam em padrões de comportamentos, ou crenças limitantes, o que nos faz buscar sempre mais do mesmo ou recriar sempre o mesmo mundo de esforço, prazer e sofrimento. Um mundo de infelicidade.


Se compreendermos a lógica da mente, o que temos que fazer é não resistir às suas tendências; tentar barrar os interesses adquiridos é lutar em vão, pois a mente sempre vence, e todo esforço é apenas desperdício de energia vital.


É fácil de entender isso: quando um pensamento tendencioso surge na mente, somos impelidos a ação; qualquer tentativa de resistir torna-se uma perturbação, um pensamento fixo que, a depender da intensidade, faz da vida um inferno. Basta um simples exame de consciência para essa constatação.


Enquanto não tivermos a clara percepção da relação direta entre pensamento x ação, que no caso é uma reação impulsiva, não seremos livres, mas escravos da mente.  Se quisermos ser livres dos condicionamentos mentais, a única coisa a fazer é observar a mente em ação: pegue-a no pulo, exatamente no momento em que surgirem os pensamentos tendenciosos e o ímpeto para agir.


Para observar a mente em ação, apenas uma única coisa é necessária: plena atenção. E isto não requer esforço, é um estado de vigilância. Estar vigilante é precaver-se, é observar o estímulo e investigar a resposta-padrão. Plena atenção é não se deixar distrair pelas coisas de fora, porém, observar as coisas de dentro e sua influência nas coisas de fora.


Cada sensação, cada pensamento, cada emoção e sentimento, surgem e desaparecem por si sós, pois são fenômenos; assim, cada vez que não reagimos impulsivamente aos desejos da mente, as tendências vão se enfraquecendo, até se dissiparem por completo. A mente, livre dos condicionamentos, é a mente da bem-aventurança, e assim será o nosso mundo, um paraíso.


Sem resistência, sem esforço, tudo se faz e desfaz por si mesmo. Resistir é desejo de estar no controle; esforço é interesse direcionado para o próprio benefício. Iluminação espiritual nada tem a ver com conquista pessoal, não é uma meta a ser alcançada; esforçar-se para tal objetivo é afastar-se cada vez mais da realização. A iluminação acontecerá, por si só, naturalmente, no devido tempo e beneficiará a muitos; basta apenas permitir-se que ela acontecerá.


Dedicação e perseverança são necessários para aprender a observar a mente em ação. Ao surgirem os pensamentos, apenas devemos permanecer em quietude, sem nada fazer, sem nada julgar; este é o estado de tranquilo permanecer, que emergirá do aprendizado da não resistência. Enquanto não aprender isso, deixe-se levar pelas tendências da mente, observe, reflita e avalie o resultado da ação impetuosa.


A clara percepção de que tudo surge – na mente e no mundo – e tudo desaparece, por si só, sem nenhum esforço de nossa parte, é yoga; a mente que escraviza, é a mente que liberta, este é o aprendizado. Saiba que você – sua mente – é a causa do desejo e do medo, embora livre de ambos. Sem lembranças e expectativas, o sofrimento não existe.


Hari Om Tat Sat.

       

 

Essa é a finalidade do yoga – realizar a independência. Tudo o que acontece, acontece com e na mente. Quando você se der conta de que tudo acontece por si só, quer você chame isso de destino, de vontade de Deus ou casualidade, você permanece apenas como a testemunha, entendendo e apreciando, mas sem se deixar perturbar (Nisargadatta Maharaj)

9 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page