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Foto do escritorMarcelo Augusti

YOGA E A PERCEPÇÃO DO SER

Atualizado: 29 de fev.


O Ser é incognoscível, portanto, não conhecido pelos sentidos, pela mente ou pelo intelecto

(Adi Sankara)



A principal virtude a ser desenvolvida pelo adepto do yoga, aquela que nos conduz ao conhecimento do Real, é o discernimento (viveka). O discernimento é uma percepção súbita da realidade, que gera um nova relação dentro de uma vivência.


Vivência é uma experiência subjetiva do indivíduo, algo que somente a ele lhe impacta. Quando se tenta explicar uma vivência, as palavras nunca dão conta o suficiente da totalidade do fenômeno vivido. Explicar uma vivência, é o mesmo que perder o seu sentido mais amplo e o significado mais profundo.


A meta do yoga é a liberação (moksha) dos condicionamentos mentais (influências adquiridas em outras vidas devido às nossas ações), que geram as tendências inatas (samskaras) que, por sua vez, contribuem para a formação de padrões de comportamento individuais.


O yoga nos conduz pela senda da distinção entre o que é real e a irrealidade. Tal distinção é um atributo da consciência (budhi). É a “luz da consciência” que ilumina as trevas da ignorância (avydia) e promove o discernimento.


Mas o que é consciência? Consciência é “aquilo ou quem percebe”; afirmamos que temos consciência de algo quando somos informados ou inteirados “a respeito de”; quando temos conhecimento de algo, temos “consciência de”. A consciência é a testemunha da realidade.


Há três tipos de consciência:

(1) cetas, é a consciência geral dos sentidos corporais, das sensações deles decorrentes e dos objetos concretos da percepção sensorial; uma consciência voltada para “tudo o que vem do exterior”;


(2) jñanakhanda, é a consciência dos conteúdos da mente, das representações dos objetos, dos conceitos e abstrações sobre a realidade; a consciência voltada para “tudo o que está no interior”;


(3) jñanam anidassanam, a consciência que emerge somente quando os sentidos se aquietam (quando “tudo o que vem do exterior” deixa de ser referência) e a mente silencia (quando “tudo o que está no interior” deixa de ser padrão para a ação); é a consciência pura, integrativa, aquela que unifica a parte ao todo.


Consciência é conhecimento. Nos dois primeiros tipos, a consciência é fragmentada, pois os sentidos não estão integrados e tampouco a mente se encontra em harmonia; logo, o conhecimento se dá por meio de fragmentos da realidade; o Real, o Todo, “Aquilo que tudo abrange e unifica”, não pode ser conhecido.


Jñanam anidassanam é conhecimento puro, isto é, natural, transparente, simples e indivisível. É a consciência além do tempo e espaço; não pode ser localizada, surge e logo desaparece, pois não pode ser retida; ela é vazia de conceitos, nomes, formas e palavras, desprovida de sinais, sentidos e significados; é ilimitada e infinita; trata-se de uma consciência em que nada se manifesta.


A consciência dos objetos captados pelos sentidos corporais e da percepção da mente e suas abstrações é temporária; ceta e jñanakhanda são consciências do irreal (asat), pois irreal ou inexistente é tudo aquilo que não tem origem própria e não subsiste por si mesmo. Assim, se diz que todos os fenômenos do mundo manifesto são irreais ou ilusórios, pois são todos impermanentes.


Quando a consciência se fixa nos objetos da percepção sensorial e nas abstrações da mente, surge o sentimento de “eu”, que nada mais é do que a identificação com aquilo que não é real. O “eu”, este conglomerado de ideias, conceitos, percepções sensoriais, memórias e “experiências de vida”, portanto, é inexistente.


Mas, então, o que é o Real? Diz o Bhagavad Gita (2.17): “Saiba que Isto que a tudo permeia é o Imperecível. Ninguém pode causar a destruição Daquilo, o Inesgotável.” Quando compreendemos que aquilo que permeia todo o universo e a todos os seres é a consciência, e que consciência é conhecimento, então podemos repousar na consciência como aquilo que é Real (sat).


A consciência é existência. A entidade viva, em sua essência, é pura consciência (Atman). Esta é a percepção do Ser, Brahman – o Real, A Consciência Cósmica, o Autoexistente – pois que tem em si mesmo, a base de sua própria existência. Tudo surge e desaparece no mundo fenomênico; mas Brahman, embora permeie a tudo, nada lhe afeta.


A consciência individual (Atman), logo, é idêntica à Consciência Cósmica (Brahman); por isso, e somente por isso, é possível conhecer Brahman, o Ser que é pura Existência, Consciência e Bem-aventurança (Satcitānanda).


Assim, se diz de uma mente iluminada, que é uma mente que a tudo vê claramente, sem interposições, sem julgamentos; nada lhe é oculto, pois ela enxerga o Todo em cada parte e em toda parte ela vê o Todo; é uma mente plena de harmonia e contentamento com a vida e tudo o que nela há. Diz o Bhagavad Gita (6.30): “Para aquele que Me vê em toda a parte e vê tudo em Mim, Eu nunca estou perdido, nem ele estará jamais perdido para Mim.”


O yoga é a via direta que nos livra da ilusão do sofrimento; quando compreendermos, pela consciência pura, que o mundo fenomênico e suas manifestações (vikara) são, de fato, inexistentes, pois são distorções do Real – como miragens no deserto, aparências fabulosas, sonhos – então estaremos aptos a superar todas as inconstâncias, incongruências e instabilidades da breve vida humana.


A cessação das ilusões e o consequente fim do sofrimento, é resultado da investigação de nossa natureza, o que se faz por meio da meditação; é na meditação que emergirá a consciência pura, que dará fim às ideias, conceitos, percepções sensoriais, memórias e “experiências de vida” às quais identificamos como “eu” e “meu”, aquilo que é irreal. A meditação, portanto, é o caminho possível para a percepção do Ser e, consequentemente, para a felicidade genuína.


Hari Om Tat Sat.

 

 

Brahman é o Real, a Consciência, o Infinito

(Taittiriya Upanishad. 2-1)

 

Brahman que é imediatamente conhecido por todos, e quem é o mais íntimo de todos (Brihadaranyaka Upanishad. 3:2-1)




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