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Foto do escritorMarcelo Augusti

YOGA E A REALIZAÇÃO DA PLENITUDE

O ser humano, que é a mais alta manifestação do Absoluto neste nosso planeta, é um ser maravilhosamente organizado, embora conheça muito pouco da sua natureza real. Assim, antes de querer achar a solução dos segredos do universo exterior, o ser humano deve saber governar o universo interior – o reino do Si Mesmo. O que o praticante deve conhecer em primeiro lugar, portanto, é sua própria essência fundamental (Yogue Ramacháraca)



A realização no yoga é a plenitude. Plenitude é um estado de superabundância, de grandeza inefável, de totalidade com tudo o que a nossa compreensão considera como transcendente e divino.


Plenitude é um termo do antigo grego que significa “Eu preencho”. Pleno, portanto, é aquele que está repleto da abundância da graça divina.


Na tradição do yoga, o Divino é Satcitānanda, ou seja: Existência (sat), Consciência (cit) e Bem-aventurança (ānanda). O Divino, logo, é pleno de Existência, Consciência e Bem-aventurança infinitos.


Realizar-se no yoga é realizar-se no autoconhecimento e na transcendência. Pois, assim como o Divino, nossa essência é Satcitānanda. Porém, sofremos de uma amnésia profunda, cujo tratamento é o yoga.


No yoga, o autoconhecimento se faz, basicamente, por duas vias: a primeira, é pelo estudo e reflexão dos textos sagrados; a segunda, é a prática, sobretudo, da meditação.


Meditar é a essência do yoga, pois é a plena concentração que possibilita a quietude da mente. É neste estado de quietude da mente que a nossa essência se revelará.


Dentre as quatro principais vias de acesso ao yoga, o Raja Yoga é aquela que tem como foco a meditação e o autoconhecimento. Sentar-se em silêncio para adentrar o "mundo interior", e observá-lo para conhecer a paz profunda que somente dele emana: isto é Raja Yoga, o "caminho da meditação".


Considera-se os Sutras de Patanjali, por volta do século IV a.C., como a origem do Raja Yoga. Nos Sutras, Patanjali descreve um sistema de Yoga com oito etapas, no qual a oitava é Samadhi ou a interiorização profunda.


Samadhi é o estado de plena contemplação, que leva o praticante ao alcance da compreensão total da existência e a comunhão com o divino. Samadhi é o ápice da meditação e do controle psíquico.


Quando o praticante realiza o samadhi, as funções da mente estão em completo controle (samādhana), resultando na manifestação de vários níveis de consciência da verdade (samapātti).


A verdade é o conhecimento de nossa essência, isto é, da Realidade. Conforme o praticante avança na meditação, a consciência se amplia e se aprofunda, revelando-lhe gradualmente a "Verdade da Realidade".


Patanjali expõe, nos Sutras, esses níveis de consciência, onde a Realidade é aos poucos desvendada, até que o praticante alcance kaivalya, a completa separação das coisas mundanas. São eles:

 

1)      Savikalpa samadhi, que se diz o estado de consciência em que ainda restam resíduos (ou “sementes” - sabija) das noções de tempo, ou seja, onde ainda há memórias e tendências não superadas na mente;

 

2)      Nirvikalpa samadhi, que se diz o estado de consciência sem resíduos das noções de tempo, isto é, quando a mente permanece livre de quaisquer reminiscências ou tendências.    

 

Savikalpa samadhi é o primeiro nível da elevação da consciência. Em tal estado, o praticante tem a experiência do êxtase da “união com o Divino” (yoga). Ele sente-se inundado pela alegria, gratidão e bondade divinas.


O conhecimento adquirido em Savikalpa samadhi está além dos conceitos e preceitos: é o conhecimento “real daquilo que é”, não o conhecimento da “ideia daquilo que é”.


Porém, esse conhecimento é referente aos Mahabhutas, isto é, os “cinco grandes” aspectos fundamentais da realidade física (água, fogo, ar, terra e éter). Todo os "mistérios e segredos" da vida terrena lhe são revelados.


Entretanto, neste nível de consciência, a experiência do êxtase e da graça divinos não são constantes. Como ainda há “resíduos do tempo” na mente, o praticante não mantém a estabilidade de uma “mente tranquila” ao retornar do estado meditativo.


Há ainda muitas recordações e lembranças sobre si mesmo como pessoa. Suas conexões com as “identificações exteriores” não foram superadas. Embora tenha “provado” do Divino, a consciência ainda permanece centrada no senso de ego e nas coisas do mundo terreno.


Portanto, neste tipo de samadhi, ainda que ocorra uma percepção temporária da natureza do Divino, o senso de individualidade ainda permanece, porém, sem as narrativas infinitas da mente, que mantém-se em um estado de serenidade e contemplação.


Em Savikalpa samadhi, essa mente ativa em um nível de consciência elevado, propicia ao praticante a apreciação de uma “natureza mais elevada”, e o que foi apreciado em sua experiência será arquivado na memória.


Ao retornar de Savikalpa samadhi, o praticante trará algo de seu aprendizado do “mundo interior”, em que poderá refletir para transformar sua jornada terrena. Entretanto, ainda que tenha vislumbrado Ananda (a infinita bem-aventurança e paz interior), isto não é a realização da plenitude.


O Divino é a Realidade Última, a verdade a ser revelada, a realização da plenitude que se alcança pelo yoga. Assim, ao avançar na prática da meditação, outros níveis de consciência emergirão de um estado mental cada vez mais sereno, reluzente e profundo.


Nirvikalpa samadhi é o estágio mais avançado da meditação. Em Nirvikalpa samadhi, a consciência alcança seu nível mais elevado de amplitude, profundidade e resplandecência. A mente, então, reflete o fulgor da consciência.


Entende-se o Nirvikalpa samadhi pela origem da palavra: a raiz sânscrita Nir significa “extinção”; logo, nirvikalpa é a extinção de todas as tendências e reminiscências da mente, isto é, de todo karma. Em suma, é a cessação de tudo que gera desejo, angústia, ansiedade e sofrimento.


Considera-se o Nirvikalpa samadhi como a última meta a ser alcançada pelo ser humano, o que corresponde ao reconhecimento da identidade entre espírito e matéria, entre humano e Divino, entre a consciência individual e a Consciência Cósmica, entre a mente finita e a mente universal.


Porém, este reconhecimento não se faz pelo intelecto, isto é, pelo estudo ou reflexão, mas, unicamente, pelo conhecimento direto do Divino. Em Nirvikalpa samadhi não há mais nenhum resquício de qualquer dualidade, diferença ou separação entre sujeito e objeto, observador e observado, sagrado e profano, entre caminho, caminhante e caminhada: tudo se revela em uma Unidade em perfeita harmonia, a Realidade em si.


Nirvikalpa samadhi é Sahaja, isto é, a pura consciência que emerge naturalmente de sua própria luz; é a consciência plena, contínua e sem qualquer esforço, um estado de tranquilo permanecer e de infinita beatitude.


Sahaja é a cessação dos desejos, dos apegos e aversões; é laya, a dissolução do egoísmo. A permanente quietude do fluxo mental é nirati, e o que fica é a Voz do Silêncio ou Nāda, o "Som do Divino", que não pode ser captado pelos ouvidos, pois sua vibração é por demais sutil; é o som transcendental (Shabda Brahman), que apenas a alma autorrealizada pode ouvir e se deleitar.


É em tal estado que o praticante não apenas se une, porém, se funde, com o Divino; é a gota (o indivíduo) a se dissolver no oceano (o Universo). Esta é a realização da plenitude, isto é a perfeição do yoga.


Quando se realiza esse Nirvana – a infinita beatitude - a etapa seguinte para o iogue é o Maha Samādhi, que é a saída consciente do corpo físico no momento da morte. Mas isso é outra conversa.


Hari Om Tat Sat.

 


A alma de cada um de nós contém a Divindade em potência. O fim que devemos alcançar é fazer emergir essa Divindade que existe em nós, dominando a nossa natureza externa e interna. Alcançado esse fim, seja pelo trabalho ou devoção, seja pelo domínio psíquico ou pela filosofia; seja por um, por vários ou por todos esses caminhos, não importa – tornai-vos libertos de todo condicionamento. Nisto consiste o yoga. As doutrinas, os dogmas, os rituais, os livros, os templos e as formas, tudo não passa de circunstâncias secundárias (Swami Vivekananda)




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