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Foto do escritorMarcelo Augusti

YOGA E OS SENTIDOS

Atualizado: 19 de jul. de 2023





Podemos não perceber o que está ao alcance dos sentidos porque estamos: desinteressados ​​ou muito distantes; excessivamente interessados ou muito próximos; distraídos ao que está à nossa frente; não se relacionando com o que está lá; deixar outras coisas desviar a atenção; confundindo com algo semelhante (Samkhya Karika, 8)



A filosofia Samkhya, que é um dos pilares teóricos do Yoga, nos ensina que os seres sencientes são dotados de faculdades sensoriais (indriyas), representadas pelos cinco órgãos de percepção (jñanendriyas), quais sejam: visão (chakshu), audição (shrotra), olfato (ghrana), paladar (rasa) e tátil-cinestésico (tvak). São as faculdades sensoriais que nos permitem “viver a vida” e “experimentar o mundo”.


As faculdades sensoriais são responsáveis pelas informações que chegam do “mundo exterior”; é por meio dos cinco sentidos sensoriais que as sensações advindas do contato com o “mundo exterior”, são percebidas, identificadas e transformadas em conhecimento. Os órgãos dos sentidos, portanto, nos conectam ao “mundo exterior”, sendo como “janelas” para a entrada das informações originadas de nossas experiências.


As faculdades sensoriais ou sentidos cognitivos, são parte de um sistema de comunicação e comunhão entre o “mundo interior” e o “mundo exterior”, pois une o corpo/mente que percebe com os objetos percebidos. Enquanto os sentidos corporais captam as sensações do exterior, a percepção sensorial cabe à mente. É a mente que interpreta, julga, discerne e armazena as impressões vindas de fora, organizando, assim, a compreensão da existência.


A mente opera em quatro dimensões: o intelecto (buddhi), que é a habilidade de comparar, julgar e discernir por meio do raciocínio lógico (é o pensar correto); a memória e a imaginação (manas), que é capacidade de armazenar as informações processadas pelas suas percepções em todas as vidas já vividas e projetar uma realidade; o senso de identidade ou ego (ahaṅkāra), que nos dá a noção de individualidade, de pertencimento e o instinto de sobrevivência; e a consciência (citta), que é o princípio universal que nos impele à Inteligência Cósmica.


A questão primordial dos sentidos é se podemos confiar nas percepções da mente. Pois as sensações que nos tocam, a princípio, são apenas vibrações da energia vital; entretanto, quando entram em contato com os órgãos dos sentidos, elas são afetadas pelas tendências interpretativas que ali já se encontram. Isso quer dizer que, se os nossos canais de comunicação e comunhão entre “interior” e “exterior” não estiverem purificados, nossos sentidos estarão limitados a acolherem determinados tipos de vibrações, em detrimento de outras.


Isto ocorre pois buddhi somente pode operar conforme os conteúdos alocados em manas que, por sua vez, fica na dependência das escolhas de ahaṅkāra. Portanto, quando o senso de identificação com as coisas do mundo (ego) prevalece como a dimensão principal da mente, desenvolvemos comportamentos tendenciosos, conforme as impressões (samskaras) gravados no subconsciente (as memórias de manas que condicionam a nossa conduta), e os desejos subliminares (vasanas), ocultos, pois, da consciência (citta), e que nos impulsionam a agir e pensar sempre do mesmo modo.


Temos, assim, que todas as nossas experiências deixam marcas em manas; tais marcas, embora sutis, são indeléveis, pois se alocam sorrateiramente no subconsciente, e passam a determinar todo o nosso destino, não apenas nesta vida, mas também nas próximas. Isto é o que se denomina no yoga como karma, ou seja, o movimento da vida (uma ação projetada), que tem como princípio orientador a lei universal de causa e efeito, fenômeno este bem explicado pela filosofia Samkhya.


Isto pode ser confirmado pelos estudos da antropologia dos sentidos. Vejamos o que diz um renomado pesquisador sobre este tema:


As percepções sensoriais não dependem somente de uma fisiologia, mas, em primeiro lugar, de uma orientação cultural, deixando uma margem à sensibilidade individual; elas formam um prisma de significações sobre o mundo, e são modeladas pela educação e utilizadas conforme a história pessoal (David Le Breton, em Antropologia dos sentidos)


O que o cientista social afirma é que são as nossas percepções que dão sentido e significado ao "nosso mundo", servindo-nos de referência identitária, nos situando como indivíduo pertencente a uma certa cultura e sociedade, de um determinado lugar e época. As faculdades sensoriais constroem, assim, a nossa história pessoal. Ou seja, nossos sentidos podem ser educados para reconhecer as sensações que já fazem parte do catálogo de manas, facilitando a identificação com as coisas já admitidas como verdade e realidade (nossos condicionamentos), atentando-se, assim, para captar e reverberar sempre os mesmos tipos de vibrações.


Entretanto, ele também afirma que, apesar de sofrerem um condicionamento cultural e social, enclausurando-nos em padrões de comportamentos típicos do nosso contexto, há uma abertura para a sensibilidade individual. Isso quer dizer que, embora buddhi e manas estão alinhados com as tendências e desejos de ahaṅkāra, a única possibilidade para escapar dessa “armadilha”, é o despertar de citta. Quando a consciência desponta, todo o “esquema” do ego é desmantelado.


Citta é a dimensão da mente em que não há memória, tendências ou desejos. Citta é a inteligência pura; ela é o princípio universal ativo - a consciência - que nos eleva ao patamar superior da vida, libertando-nos de todos os condicionamentos de manas e das tendências de ahaṅkāra, permitindo, assim, que buddhi se ilumine e o discernimento (viveka) desponte para a plena sabedoria.


O yoga nos conduz a citta. Quando esta dimensão da mente predomina em nossa vida, isto é, quando pensamentos, palavras e ações são guiados pela consciência, realizamos Íshvara Pranidhana, ou seja, nos colocamos em comunicação e comunhão com a Presença divina em nós. Isso significa que nossas faculdades sensoriais se tornaram purificadas e, assim, podemos perceber claramente no “mundo exterior”, toda a beleza e infinitude que habita em nosso próprio “mundo interior”. Por fim, concluiremos que não há "mundo exterior ou interior", pois tudo é uma única expressão da Inteligência Cósmica.


Hari Om Tat Sat.


Uma pessoa livre do desejo ganha pureza e pela pureza adquire conhecimento.

Não há dúvida sobre isso (Shiva Purana, 13:54)

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